SECA NO NORDESTE – POR QUE SOMOS TÃO POBRES?
Depois de parar e posar para a foto, eles vão caminhar alguns
quilômetros e transportar na cabeça, em galões de zinco, alguns litros
de água para tomar um banho. Quem conhece, sabe como pesa um galão de
água deste tamanho na cabeça. A cisterna, reservatório de água que
aparece atrás do grupo, está vazia por causa da seca que castiga o
Nordeste brasileiro de forma tão inclemente como não se tinha registro
nos últimos 85 anos. Comprar água de um carro-pipa para abastecê-lo é
impossível.
No alcance da lente do fotógrafo, só o cinza da paisagem,
interrompida aqui e ali pelo verde tímido da algaroba. O chão está seco,
esturricado. A poeira transportada pelo vento cola na pele, nos
cabelos, nas roupas e deixa os personagens com uma maquiagem natural de
terra. A única luz da fotografia vem do sol de fim de tarde no sertão,
lambendo-lhes o lado esquerdo do rosto.
Nos braços da professora Márcia, o menor do grupo. Quantos anos terá?
O que lhe reserva o futuro? Os outros cinco, que formam uma espécie de
escadinha demográfica da casa, sorriem para nós, pois neles a inocência e
a falta de consciência das coisas, natural para a idade, ainda não lhes
despertou para a realidade a que estão submetidos. São felizes, ponto
final.
Quase todo o Brasil cabe nesta foto. Ela nos cobre de vergonha da
cabeça aos pés e surge diante de nós para refutar, sem direito a
argumento contrário, qualquer idéia de país rico, líder de um bloco
econômico chamado Bric, e que vai sediar uma Copa do Mundo em 2014 e uma
Olimpíada em 2016. Que triste e desigual país é este? Por que ainda
somos tão pobres e temos tantos problemas em encarar esse fato?
Conviveremos até quando com esta imagem?
Este é o pedaço do Brasil onde nunca chegará a água da Transposição
do Rio São Francisco, a jóia da coroa do PAC I, por onde já escorreram
mais de 8 bilhões de reais. O que há no projeto criado por Lula – ele
próprio a encarnação do brasileiro que fugiu de uma fotografia como esta
e tornou-se o presidente mais popular do Brasil – são canais vazios
formados por placas rachadas no solo seco entre a Bahia e Pernambuco.
Daqui a cem anos, quando não estivermos mais aqui, é bem provável que
esta cena possa ser repetida para outro fotógrafo de forma
absolutamente igual em pose, gestos, contexto e geografia. Também por
outras professoras Márcias que vão lá, tentam mudar uma realidade tão
difícil por meio do conhecimento. E também por outras crianças, e outras
cisternas vazias, e outros galões, e outras terras ressequidas, e
outras nudezes.
Fonte - http://www.thaisagalvao.com.br/
Copiado de http://tokdehistoria.wordpress.com
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