As verdades do Capitão José da Penha

Original em: http://trindade.blog.digi.com.br/category/religiao/

O capitão José da Penha nos surpreende a cada momento em que temos acesso a fatos de sua vida. Em 1899, ele tinha terminado de escrever, com apenas 24 anos, o livro “O Espiritismo e os Sábios.” Vamos transcrever, mantendo a ortografia, tanto quanto possível, um trecho do livro.

Raimundo de Farias Brito, em uma introdução, diz : “ O auctor, com effeito, collocando-se no terreno dos princípios geraes, faz não defesa de uma these, mas estudo comparativo. Aprecia a influencia da religião sobre a moral, a influencia da moral sobre o governo. E de sua analyse, sempre imparcial, por vezes emocionante e cheia de ardor, sempre justa, sempre sincera, vistas são lançadas que tocam de perto aos mais árduos problemas da especulação metaphysica. E uma cousa fica fora de duvida: é que o jovem auctor deste livro, é um temperamento profundamento religioso, revelando neste trabalho, como em outros, do modo o mais saliente a sede de ideal que o devora.”

Há um momento no livro, que fazendo uma análise sobre Alan Kardec e sua obra, J. da Penha diz:

“O certo é que os principios básicos do “Livro dos Espíritos” são, em francez, e no estilo do autor, os mesmos de que nos deixaram uma recordação escrita, os collaboradores das mais prístinas civilisações”. Continua J. da Penha: “ Aquietem-se os mais abespinhados pela franqueza desse reparo, porque não entra nos meus calculos a preocupação da hostilidade ao patrono do espiritismo contemporaneo, tão somente buscarei prestar submissão aos imperiosos reclamos da verdade.” Aí ele continua, abrindo um espaço para a verdade em que acredita, escrevendo: “Ventilando fatos incontestáveis, será difícil guiar para o desacerto e a injusticça: alem de que a verdade è, para mim, a única razão de ser de nossos idéaes. Não sou dos inclementes na punição de nossas fraquezas, mas considero uma das mais puníveis, deixar deliberadamente que a mentira se combine com a tinta para a ocupação caligráfica do papel.Transmitir a nossos semelhantes idéas deturpadas pela hipocrisia, antolha-se-me uma das mais requintadas vilezas da consciência. Rebuçar com o vigor do colorido, a intensidade da imagem, a dutilidade da forma de um paramentoso estilo, a sinceridade a nos escapar da penna, é exercitar-se num dos mais repugnantes jogos da intelligencia. Imprimir mentiras para lisongear paixões, apaniguar interesse e condescender com o erro, é dar abominável emprego ás faculdades, que nos distinguem do bruto, remido de sua inferioridade, si também soubera escrever. Transigir com a falsidade ao publicar o resultado de suas vigílias, condiz com a mais completa expressão de pusilanimidade de um espírito, malfazejo e tábido si, alem disso, tripudia sobre os destroços da ingenuidade dos que não tiveram ensejo de polir o entendimento. A palavra escrita é um dos mais seguros elementos de triunfo nas lutas pela civilização e pode-se até dizer que ruiriam por terra todas as outras instituições, si, por uma combinação satânica e impossível, parassem para todo o sempre todas as pennas do mundo. Contrista-me de véras, que possamos abusar, em proveito de nossas vis paixões, de tão soberana faculdade; enluta-se me o espírito quando me lembra que póde alguém vasar no livro, no jornal e no pamfleto, impressões que não sentiu, dissimulando as fórmas da verdade, rebuscando nas cintillações dimantinas do idioma bem estudado, o meio de ocultar por algum tempo as refulgências da justiça. Manejar a penna, o mais simples e maravilhoso instrumento auxiliar da alma, para architetar calumnias, abocanhar sorrateiramente ilibadas reputações, provocar a explosão de ódios adormecidos, referendar a prepotência, abafar o grito da innocencia e combater o respeito á honestidade das idéas sãs, - equivale a galgar a culminancia da escala de uma certa classe de crimes, para os quaes se não inventou ainda o maximo rigor de leis, compatíveis com o estado atual da moralidade humana. Entre o envilecer-me nas praticas servis de tal função e o desaprender de todo o abecedário, elegeria a segunda contingência, ficando ainda orgulhoso de ser analfabeto. Perdoaria e comprehendo, a improbidade e o embuste em todos os comércios, exceto no das letras. Escrever é um sacerdócio a que todos deviam respeitar. De mais de uma falha se resente meu espírito, inadaptável, por esse motivo á hipocrisia literária do meio, em que se desenvolve com insuficiencia e lentidão. Ora, a lealdade dos pensamentos vibrados neste papel, e a possibilidade de armar uma injustiça contra A. Kardec ou qualquer outro, repellem-se como a virtude e o vicio. Não é diminuta concessão lhe atribuir qualidades e méritos, que outros timbram em negar, não lhe concedendo nem o do amor e apego das idéas que propagava. O trabalho de adaptação da metafísica oriental, ao estado de crenças dominantes no seu tempo, face a face de uma civilisação muito mais opulentada de conhecimentos cientificos, artísticos e filosóficos, reclamava-lhe grande copia de aptidões e esforços. Reunindo em si todos os predicados de um reformador, no departamento em que desabrochou com exhuberancia a sua intelligencia, saiu-se galhardamente da empreza. Tinha o condão de arrebanhar prosélitos, de gerar fanáticos, de organisar partidos. Provam-no – e do modo mais irrefragável – as innumeras dedicações que se creou e a mesma celebridade a sobreviver á sua morte.”

Este livro merece ser reeditado, para conhecimento de todos. Este artigo foi publicado no O Jornal de Hoje

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